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quarta-feira, 27 de outubro de 2010

A Mulher De Trinta Anos (la Femme De Trente Ans) (BALZAC) - Resumo

A MULHER DE TRINTA ANOS
Honoré de Balzac



Tradução: Marina Appenzeller

Do prefácio de Philippe Berthier

"Trata-se (...) de uma meditação complexa, mas profundamente conservadora, sobre os danos da transgressão social e moral, o inelutável cortejo de catástrofes que ela implica: os "primeiros erros" inauguram uma fatalidade que, de elo em elo, semeará a desgraça numa família, inevitáveis seqüelas da irresponsabilidade e da desobediência. Julie é uma jovem encantadora, mas principalmente uma desmiolada que se enamora pelo que há de mais superficial (a beleza física) para ligar sua vida à de um imbecil e egoísta: de nada adiantam as advertências do pai (numa cena que se repetirá na geração seguinte por duas vezes, ilustrando a triste verdade prática segundo a qual, para sua grande desgraça, os filhos não ouvem jamais as advertências dos pais, eterno retorno da cegueira das paixões). Apesar dos sinistros presságios de um número maldito — o décimo terceiro domingo de 1813 —, e já às vésperas da débâcle histórica em que a nação vai se precipitar, um destino individual sela, por frivolidade, seu desastre. Filha rebelde, Julie toma o caminho da afirmação do desejo pessoal a qualquer preço, que, para Balzac, é sempre fatal, porque ignora a necessidade da submissão às altas exigências da existência social.

"O trauma de uma noite basta para aquilatar a brutalidade de Victor, que não tem a menor idéia das expectativas de sua esposa. Incapaz de fazer com que ela partilhe seus prazeres, ele a trata como mero objeto sexual. Esse medíocre inconsciente não vê praticamente nenhuma diferença entre seu cavalo e sua mulher, que logo passa a sentir por ele apenas piedade e desprezo. Balzac não é condescendente com a fatuidade masculina e tampouco com a leviandade feminina. O casamento aparece então como uma odiosa impostura, uma prostituição legal. Nesse mercado de tolos, a mulher tem infinitamente mais a perder que o homem, pois a opinião pública costuma ser indulgente com todas as faltas deste, enquanto que ela permanece prisioneira de seus deveres; a reprovação geral que sancionaria qualquer falta de sua parte afigura-se a Balzac como a punição pela infração às leis ou o sintoma de "tristes imperfeições das instituições nas quais repousa a sociedade européia" (leia-se: os casamentos "arranjados" por questões de interesse). Armadilha mortal para a mulher que não soube (ou não pôde) escolher seu esposo, o casamento exige, com razão, que se honre o pacto solene firmado diante de Deus e dos homens; ele garante aos indivíduos imensas vantagens, mas também exige sacrifícios, e é o cúmulo do ilogismo interessado pretender se furtar a suas obrigações, ao mesmo tempo em que se tira partido de suas prerrogativas. Afinal de contas, comenta ferozmente Balzac, os infelizes sem pão, que respeitam a propriedade alheia, não são menos de lamentar que as mulheres infelizes em função de uma má escolha conjugal. Julie recebe o funesto pagamento à sua imaturidade juvenil, à sua incompreensão dos grandes imperativos — prescritos pela sociedade para que possa subsistir —- do alcance destes. O amor de Arthur — sublime mas, de forma masoquista, repelido — apenas confirma a contrario o caráter carceral que a instituição do casamento tem para a mulher."



Sobre A mulher de trinta anos

Nesta precoce análise das mazelas do matrimônio enquanto cerceamento da mulher —"Casada, ela deixa de se pertencer, é a rainha e a escrava do lar" —, Balzac retrata o casamento como pilar da sociedade burguesa (agora pós-revolucionária, "o encanto do amor desapareceu em 1789") na França. Embora intrinsecamente conservador — talvez por isso mesmo —, a imagem que o autor traz da situação de mulheres curvadas sob o peso de suas obrigações sociais e legais é digna de interesse social, histórico e psicológico. Ideologicamente, sabemos que Balzac respaldava o casamento, e esta obra tinha a função de um libelo contra a "leviandade da mulher", dando origem a uma Julie remoída por abissais sentimentos de desejo e culpa, mas o próprio texto e os personagens se encarregam de traí-lo e fica-nos uma forte impressão de que Balzac o denuncia nas entrelinhas em suas estruturas mais fundamentais. Assim, são deliciosas, se não memoráveis, e um tanto inusitadas para a época, as páginas em que Balzac retrata com derrisão o homem casado, tome-se o marido de Julie, o insípido Victor d'Aiglemont, que parece não discernir com muita clareza entre seu cavalo e a mulher.

O que restou desta obra, para além de algumas falhas de construção (por exemplo, Balzac usa condessa por marquesa, ao descrever a tia de Julie, pois com a Restauração a marquesa recuperaria seu título, mas isso não fica suficientemente claro para o leitor e aparece como lapso do autor — propositadamente não foi corrigido nesta tradução), são trechos de um belo lirismo e forte inspiração sobre o amadurecimento da mulher (Balzac parece ao mesmo tempo lamentá-lo...), justamente sua passagem para a idade balzaquiana e para uma outra beleza, a da maturidade, para cuja construção o casamento seria um mal necessário: "A fisionomia da mulher só começa aos trinta anos".

Vemos aqui um Balzac "em construção", ora tecendo uma reveladora "análise psicológica", ora se inclinando para o "folhetim desvairado", e de uma riqueza notável ao abordar pontos essenciais de sua obra, como nota em seu prefácio Philippe Berthier, um dos mais destacados estudiosos de Balzac na atualidade.

Cerca de meio século antes, Goethe já nos descrevia com maestria, em Os sofrimentos do jovem Werther, as conseqüências trágicas de uma paixão desenfreada que a sociedade, os costumes e as leis proibiam. O século XIX encarregou-se de amainar os excessos românticos dos personagens, a Revolução Francesa deixara suas marcas (é interessante observar a presença de Napoleão em cada um destes autores) e o que não se consumia em Werther já assume contornos algo mais pragmáticos, ou... modernos, em A mulher de trinta anos.

"A mulher de 30 anos" As Balzaquianas por Marcelo Aith"

Neste texto Marcelo Aith faz um breve resumo sobre o livro A Mulher de 30 Anos de Honoré de Balzac para quem ainda não teve a oportunidade de ler (como eu), mas tem interesse em saber do que se trata. O que eu posso antecipar é que é sobre uma mulher de 30 anos.

"Muitos já ouviram ou usaram o termo 'balzaquiana' para designar um certo tipo de mulher. Mas nem tantos, realmente, chegaram a ler "A Mulher de Trinta Anos", de Honoré de Balzac. O escritor francês viveu na primeira metade do século XIX (1799-1850) e é este o ambiente que encontraremos em sua obra. Mais do que um simples romance, é também uma aula de história, onde desfilam os acontecimentos de uma França pós revolucionária, durante o governo de Napoleão Bonaparte.



O livro trata a fundo da questão do destino da mulher na sociedade e, em particular, dentro do casamento. "A Mulher de Trinta anos" contém estudos de psicologia feminina de extrema agudeza. Sua personagem principal, Júlia d`Àiglemont, é o primeiro grande retrato da mulher mal casada, consciente da razão de seus sofrimentos e revoltada contra a instituição imperfeita do matrimônio.

Constitui uma etapa na história da emancipação feminina. Revela-nos os sofrimentos da mulher incompreendida que não encontrou no casamento a realização de seus sonhos. Balzac é um dos primeiros a focalizar o drama da incompatibilidade de casais. Prestou um serviço imenso às mulheres, ao duplicar para elas a idade do amor. Antes dele, todas as namoradas de romance tinha vinte anos. Ele prolongou até os trinta, quarenta anos, sua vida ativa, idade que considerava o ápice da vida amorosa da mulher.

No primeiro capítulo, em uma época onde nem ao menos se sonhava com o divórcio, o pai de Júlia a alerta sobre os cuidados da boa escolha de um marido: "As moças criam freqüentemente nobres, arrebatadoras imagens, figuras ideais, e forjam idéias quiméricas a respeito dos homens, dos sentimentos, do mundo; depois atribuem inocentemente a um caráter as perfeições que sonham e nisso confiam; amam no homem de sua escolha essa criatura imaginária; porém mais tarde, quando não há mais tempo para libertar-se da infelicidade, a ilusória aparência que embelezaram, seu primeiro ídolo, enfim, se transforma num esqueleto odioso." Sobre o futuro genro ele conclui: "'E um desses homens que o céu criou para tomar e digerir quatro refeições por dia, dormir, amar a primeira mulher que apareça e bater-se. Não entende a vida ... não é dotado dessa delicadeza de coração que nos torna escravos da felicidade de uma mulher...".

Mesmo assim nossa heroína casa-se com Vitor, oficial do exército de Napoleão, tornando-se a infeliz Sra. D'Aiglemont. Em carta para uma amiga confessa sua desilusão pelo amor: "Vais casar, Luisa. Essa idéia faz-me tremer. Pobre criança, casa-te; depois, dentro de poucos meses, um dos teus mais cruciantes desgostos será proveniente da recordação do que nós éramos outrora...". Sobre a noite de núpcias, escreve: "Quando meu marido entrou, quando me procurou, o riso que ouvi, riso sufocado sob as musselinas que me envolviam, foi o último lampejo daquela suave alegria que animava os folguedos da nossa infância...".

Um casamento infeliz, e uma filha. A situação de Júlia parece trágica. A descrença no amor toma conta da personagem. O marido, distante espiritualmente, mantendo relações de adultério, não mais lhe pertencia. Todos os seus sofrimentos e sacrifícios para manter a falsa união passam a ser justificados em nome da felicidade de Helena, sua filha, único bem que a prendia à vida.



A tristeza de Júlia seduz um jovem inglês. Artur, que promete o amor perfeito que seu verdadeiro marido nunca lhe proporcionara. Ambos passam a viver um amor irrealizável, o dever do casamento proíbe Júlia de concretizá-lo. "Não quero ser uma prostituta nem a meus olhos nem aos olhos do mundo. Se não pertenço mais ao Sr. d'Aiglemont, também não pertencerei a nenhum outro." As barreiras morais da época condenam-na a infelicidade eterna.


Por insistência de Artur o "affair"continua. Podemos ver, no livro, a tradicional cena em que o amante, surpreendido pelo retorno do marido, esconde-se no armário. Mas, aqui o desfecho é trágico, chegando a ser cômico, pois para salvar a honra da amante, Artur, depois de Ter os dedos esmagados pela porta do quarto de vestir, corre para o peitoril da janela e, morre congelado pelo frio da noite parisiense. O segundo amor de sua vida termina, as trevas invadem seu coração. Júlia, agora com 26 anos, não encontra alegria nem mais em sua filha.

Ela explica sua angústia: "O casamento, a instituição sobre a qual se apoia hoje a sociedade, só a nós faz sentir todo o seu peso: para o homem a liberdade; para a mulher os deveres. Devemos consagrar aos homens toda a nossa vida, eles nos consagram apenas raros instantes... o casamento, tal como hoje se pratica, parece-me ser uma prostituição legal. Daí nascerem os meus sofrimentos. Mas, entre tantas criaturas infelizes... só eu sou a autora do mal, porque quis o meu casamento."

Ao, finalmente, chegar aos trinta anos Júlia conhece o Sr. Carlos Vandenesse, que nos introduzirá às idéias do que viria a ser considerada uma mulher experiente, uma mulher balzaquiana: "Uma mulher de trinta anos tem atrativos irresistíveis para um rapaz... Com efeito, uma jovem tem ilusões, muita inexperiência, e o sexo é bastante cúmplice do amor... ao passo que uma mulher conhece toda a extensão dos sacrifícios que tem a fazer. Lá onde uma é arrastada pela curiosidade, por seduções estranhas à do amor, a outra obedece a um sentimento consciente. Uma cede, a outra escolhe... dando-se, a mulher experiente parece dar mais do que ela mesma, ao passo que a jovem, ignorante e crédula, nada sabendo, nada pode comparar nem apreciar... Uma nos instrui, nos aconselha... a outra quer tudo aprender... Para uma jovem ser amante, precisa ser muito corrompida, e então é abandonada com horror, enquanto uma mulher possui mil modos de conservar a um tempo seu poder e sua dignidade... A jovem... acredita ter dito tudo despindo o vestido; mas uma mulher... se esconde sob mil véus... afaga todas as vaidades... Chegando a essa idade, a mulher sabe consolar em mil ocasiões em que a jovem só sabe gemer. Enfim, além de todas as vantagens de sua posição, a mulher de trinta anos pode se fazer jovem, desempenhar todos os papéis, ser púdica e até embelezar-se com a desgraça."

A paixão passa a freqüentar o coração dos dois, que se tornam amantes, sob o nariz do omisso d'Aiglemont. Júlia tem mais filhos. A trama familiar continua. Mas o fundamental é que estão lançados os fundamentos das idéias de um relacionamento moderno, que respeita o direito da mulher de ser feliz, antes mesmo da mudança nos valores impostos pela coletividade.


Agora a mulher está livre para amar a quem realmente demonstre merecedor de seu amor, está livre do estigma do peso da idade e, tudo isso se deve em parte a um nome, Honoré de Balzac. Escrito no início do Século XIX, "A Mulher de Trinta Anos" aborda tema que continuam atuais até os dias de hoje, sentimentos que não se apagam com o tempo, presentes em todas as sociedades humanas, em todos os tempos, que garantem a universalidade de sua obra. Um grande clássico da literatura. Indispensável a todos os que querem se aprofundar na compreensão do 'ser mulher'!"

Postado por VaneZa em: balzaquianascomz.blogspot.com

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